As ruínas de Milreu constituem exemplo de uma uilla rustica, cuja origem esteve ligada ao crescimento económico do séc. I na Hispânia e na Lusitânia e que, numa época romana tardia, foi transformada em edifício de luxo. Em 1877 Estácio da Veiga efectuou uma escavação em extensão destas ruínas.
Do lado oriental, pouco afastados da uilla, reconhecem-se dois mausoléus: um do séc. I-II, rectangular, que contém um columbarium abodadado destinado a receber uma dezena de urnas cinerárias e sobre o qual se erguia um templete funerário; o outro é semelhante, mas possui uma câmara que se destinava a conter um sarcófago.
No séc. II, com novas obras, surgiu uma residência de peristilo e átrio, tendo sido utilizada até finais do séc. III, altura em que foi modificada com alteração profunda da pars rustica. A parte agrícola foi colocada a oriente da área residencial, onde se reconhecem os alojamentos para os criados e um lagar (hoje soterrado). A área residencial aproveitou parte das construções da uilla do séc. II, organizando-se em torno de um grande peristilo central com colunas, rodeando um pátio aberto com jardim e respectivo tanque de água. Do edifício fazem parte um átrio com fonte e repuxo, os aposentos íntimos, com salas aquecidas, a cozinha, uma grande sala com abside, que servia de triclinium e as termas, com o característico sistema de salas e tanques aquecidos.
No séc. IV a entrada foi modificada com um vestíbulo de dupla abside ladeado por pequenos tanques de água. Na mesma altura, a uilla foi novamente embelezada com mosaicos, com representações da fauna marinha. Esta temática repete-se nas paredes de uma banheira no pequeno frigidarium (banhos frios) das termas, onde os peixes representados são exageradamente gordos: vistos através da água, por ilusão óptica, não só aparentavam mover-se como as suas dimensões ficavam reduzidas à normalidade.
Também no séc. IV, do outro lado da uilla, foi erguido um edifício religioso ricamente ornamentado, passando o proprietário de Milreu a possuir um centro de culto privado. Logo em frente à entrada, encontra-se um tanque de água, semicircular, decorado com mosaicos representando peixes. O edifício era ricamente colorido, como testemunham os fragmentos de mármore e a parede do pódio, decorada em redor por um friso de mosaico policromo figurando peixes. O arquitecto concebeu a cella de forma quadrada, com uma abóbada de arestas e uma abside semicircular, com a meia cúpula decorada com mosaicos policromos. No século passado existia ainda no centro da cella um tanque poligonal: nessa posição central, só pode ter servido na liturgia de culto a uma ninfa, em que a presença da água substituía uma nascente, servindo a abside semicircular para aí ser colocada uma estátua.
A partir do séc. VI, o edifício pagão foi transformado numa igreja cristã, tendo sido descoberto no pátio uma piscina baptismal rectangular. Este recinto foi também transformado em cemitério, com sepulturas rodeando o pódio e com um pequeno mausoléu.
As inscrições funerárias gravadas entre os finais do séc. VIII e inícios do séc. X numa das colunas, mencionando uma família de muladis, Al- Hâmmû ("das caldas") demonstram, juntamente com os níveis arqueológicos mais tardios, a continuidade do povoamento até quase ao período do Califado omíada de Córdova e fazem supor que o edifício religioso também serviu de oratório e cemitério na época islâmica.
Só quando, na 1ª metade do séc. X, as abóbadas ruíram, o sítio de Milreu foi provavelmente abandonado. Muito mais tarde, nos finais do séc. XV ou inícios do séc. XVI, o local viria a ganhar uma nova vida quando, sobre as ruínas há muito abandonadas, foi erguida uma casa - único e precioso exemplo algarvio desse tipo de arquitectura civil com contrafortes cilíndricos.
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